3º DiaNo início da manhã do 3º dia, fomos purgar melhor o sistema do travão traseiro e embora a qualidade do óleo não fosse a melhor, nem do tipo indicado (Redex Dot 4), o Nando lá conseguiu que aquilo ficasse a travar qualquer coisa. Enquanto isto, o José Ramos aproveitou para andar a destruir uns portais (jogo android de interacção mundial). Aproveitei e dei uma lavagem de pressão à mota, para tentar minimizar danos na pintura, com a lama e pó acumulados. Atestadas as “meninas” seguimos para o regresso a casa, onde nos esperava um dia de 240 km de trilhos, com caminhos sinuosos, estradões, calçadas romanas, travessias de rios e ribeiras, corta-fogos, etc.
Regressados ao percurso, seguimos ao longo do Parque do Douro Internacional, na cumeeira das encostas sobre o rio, gozando de inúmeros locais de paisagem fantástica. Esta zona de Portugal é uma das minhas preferidas para andar fora-de-estrada, pois possui inúmeros trilhos bastante sinuosos e com piso não muito duro, sempre em ambiente natural com pouca presença humana.
Aproximadamente com 20 km de percurso feito e depois de passarmos próximos à aldeia de Freixiosa e de atravessarmos a ribeira de Duas Igrejas, surgiu-nos a primeira subida mais trialeira e onde deu para aquecer. A 950 foi a que deu mais luta, mas também subiu.
A seguir passámos Picote, Sendim, Urros, onde o José Ramos aproveitou para fazer mais um link aos portais.
Neste percurso encontramos muitas pessoas nos terrenos a vindimar, bem como uma “V5 Adventure” com malas laterais e top-case.
Após a passagem de Bemposta subimos a 1ª calçada romana do dia, a seguir à ribeira de Bemposta, calçada essa que vai dar à aldeia de Lamoso.
Depois de Lamoso, fizemos um desvio para descer ao miradouro da Faia da Água Alta, mais um local de paisagem fantástica, onde existe uma cascata que lhe deu o nome e uns percursos pedrestes muito interessantes.
Regressados ao nosso trilho, seguimos mais uns 5 km a rolar próximos das arribas do Douro e inflectimos para Noroeste em direcção a Mogadouro.
Em Mogadouro abastecemos as “chicas” e começámos a descer para o Vale do Rio Sabor. É também uma zona de paisagem fantástica que infelizmente tem os seus dias contados, pois assim que a barragem seja concluída e encha o último rio selvagem de Portugal, aquela zona não será mais a mesma.
As pendentes das descidas e subidas neste vale são bastante fortes e exigem atenção redobrada para não haver surpresas, mas a paisagem vale bem o esforço. Passámos por algumas pequenas aldeias já abandonadas, pois devem encontrar-se abaixo da cota de armazenamento da albufeira e a primeira parte do trajecto no vale é muito sinuosa e declivosa com constantes descidas e subidas para vencer a orografia.
Todo este trajecto ao longo do Vale do Sabor é fenomenal, não só pelo que a nossa vista nos permite observar, mas também pelos aromas de esteva, urze e alfazema, tornando-se um manjar para os nossos sentidos.
Passámos por baixo da Ponte de Meirinhos, obra notável da engenharia portuguesa, bastante esbelta e arrojada, por se tratar de um ponte em curva pronunciada.
Continuámos a descer, agora em zonas bastante mais planas, até chegamos ao primeiro local onde poderíamos atravessar o rio, do lado oposto onde se encontra a capela e se realizam as romarias de Santo Atão da Barca. Esta é uma zona bastante espraiada e larga mas com muito seixo rolado de grande dimensão, o que complica a passagem para as motas. O José Ramos arriscou e com alguma dificuldade conseguiu passar ali.
Eu sabia que existia outra passagem mais a jusante e pensava que teria algo semelhante a uma ponte, de modo que sugeri ao Nando irmos tentar passar lá. Mas enganei-me e aquela passagem era também a vau, só que numa zona mais estreita, mas também com mais corrente. Não havia outra hipótese e tivemos mesmo que arriscar, correu bem.
Subimos o estradão de acesso a Sardão, eu e o Nando entusiasmamo-nos e quando demos conta já estávamos mais de 0,5 km fora do percurso. Regressados ao percurso, voltámos a descer ao Sabor e acompanhá-lo mais alguns quilómetros, passamos a aldeia de Cilhades, também já abandonada por se encontrar dentro da cota de armazenamento, e onde têm sido desenvolvidos alguns trabalhos de prospecção arqueológica. Seguindo mais 2 kms para jusante chegámos ao local das obras da barragem, onde tivemos que subir e deixar o Sabor para trás.
Subimos a Serra da Cabreira e chegamos ao Vale da Vilariça, o qual atravessámos nas proximidades da aldeia de Sampaio.
Logo a seguir a Sampaio, surgiram-nos uns corta-fogos bastante empinados em que havia a necessidade de ganhar bastante velocidade na base, para que a 950 com todo o seu peso, conseguisse subir. Chegados ao alto, atravessámos uma zona de floresta de onde já se avistava Vila Flor, onde ansiávamos chegar para nos reabastecer.
Chegados a Vila Flor, já eram 14:30h, de maneira que só pensávamos numa coisa, procurar um restaurante. Fomos parar ao D. Dinis e em boa hora o fizemos. Entradas (Azeitonas deliciosas, torresmos e feijoada), pratos (leitão assado e posta mirandesa grelhada), tudo acompanhado com um óptimo pão local, uma garrafinha de branco fresquinho, na esplanada do restaurante, debaixo de uma ramada frondosa.
Depois de almoço, houve quem se deitasse no chão a bater uma curta sesta, só que acordou com a fraqueza e ainda se atirou a uma sobremesa bem “energética”. No final depois dos cafés ainda tivemos oportunidade de conhecer o proprietário do restaurante que nos mostrou com um jornal do brasil, que a sua casa é conhecida além fronteiras. Sem dúvida um local a parar numa passagem por Vila Flor. Ahhh, e ainda nos fez um descontozito, a conta eram 49 € e acedeu ao nosso pedido de acertar nos 45 € (3 x 15€) para nos facilitar os trocos.
Bom, com tudo isto atrasámo-nos um pouco mais do que o previsto, mas pouco antes das 16:00h já estávamos a rolar novamente e fomos reabastecer também as “meninas” que também precisavam.
Logo após a saída de Vila Flor, parámos na igreja de N.ª Sr.ª da Assunção, localizada no alto de um monte junto à aldeia de Vilas Boas, de onde se tem vistas desafogadas para os 4 pontos cardeais.
Depois de reforçarmos a nossa fé e de ganharmos alguma esperança de sermos bem sucedidos em mais esta nossa aventura, seguimos o nosso caminho, cujo objectivo mais próximo era descer parte do Vale do Tua.
Passada a aldeia de Vilas Boas, em pouco mais de 4 – 5 km, chegamos ao Rio Tua. Outro rio português de paisagens com uma beleza extraordinária e que também este está condenado pelo progresso. Também aqui estão em execução os trabalhos de construção de uma barragem que irá transformar por completo todo o atual vale.
Descemos o rio por um caminho paralelo à linha férrea do Tua (desactivada) e ao passarmos a aldeia de Ribeirinha, tínhamos o trajecto a afastar-se do rio e uma alternativa também assinalada que seguia mais uns kms no caminho entre a linha do Tua e o rio, mas que depois não tinha saída o que obrigaria continuar sobre a própria linha com todos os riscos de traficabilidade que tal acarreta.
Tínhamos consciência que se apanhássemos uma ponte na linha férrea, não poderíamos prosseguir, mas decidimos arriscar e seguir pela alternativa. Só existia a possibilidade de seguir entre os carris, pois para além da muita vegetação que entretanto cresceu pelo não uso da via, o declive para o rio era acentuado.
Passadas as motas para dentro dos carris, lá fomos nós a levar pancada com o balastro e as travessas a tornarem a passagem muito desconfortável. Mais à frente começaram as primeiras dificuldades com as caleiras de drenagem transversal que atravessam a linha. As primeiras ainda tinham largura inferior ao diâmetro das rodas, pelo que se passavam com mais ou menos dificuldade. Mas já muito depois de iniciarmos esta travessia, surgiu uma caleira de largura considerável e que me preocupou bastante a sua transposição.
O Nando só me dizia para eu acelerar e levantar a roda que eles também já tinham passado assim. Eu só pensava que se não me escorregasse a traseira sobre as pedras do balastro e até desse para levantar a roda da frente, a traseira iria bater com uma força tal que ficava com o aro feito num oito.
Decidi-me a passar devagar e contava com a ajuda deles para o que desse e viesse. A roda da frente passou mesmo no limite o que significava que a roda de trás iria desaparecer no buraco. Aí resolvi-me acelerar um bocado de forma a que a mota mal encostasse a roda na travessa do outro lado, patinasse mas não caísse, e assim foi, ficou a patinar e com a ajuda deles lá subiu. Mais uma descarga de adrenalina.
Continuados na linha chegámos à estação de Abreiro, local onde a nossa alternativa deixa o caminho de ferro e voltava ao percurso.
Após passarmos a ponte sobre o Rio Tua, iniciámos a subida da calçada medieval de Abreiro. Passado o cemitério de Abreiro, voltamos a descer ao rio e apanhámos o corta-fogo mais complicado de todo o percurso.
Desde logo iniciava-se imediatamente depois uma viragem a 90º à esquerda com talude, não estava muito limpo de vegetação, tinha bastante pedra solta, algumas com dimensão considerável e uma inclinação de arrepiar. Não era muito extenso, deveria ter entre 200 e 300m, mas era bem complicado. Mal entrei no corta-fogo só me ocorreu acelerar o mais possível para o tentar subir e a coisa até nem estava a correr mal até sensivelmente a meio. O Nando que seguia à minha frente bateu numas pedras e caíu e eu acabei por parar também, uns 20 m antes dele porque bati numa pedra grande que me desequilibrou completamente e me fez ficar sem qualquer tracção para continuar. No início ainda lhes disse que ía voltar para trás, mas quando saí da mota e olhei para baixo, fiquei na dúvida o que seria pior, a subida do resto ou a descida do que já estava feito. Baixei o mais que pude a pressão do pneu traseiro até aquele se deformar facilmente e com a ajuda dos meus colegas num primeiro impulso, lá consegui arrancar e fazer o resto. Quando cheguei à parte mais plana e parei, senti um formigueiro nas pernas, para não dizer outra coisa, que deveria ser resultado da enorme descarga de adrenalina que devo ter tido. Não aconselho a passagem por ali em trail.
Esta era a vista a meio do corta-fogo.
Continuámos a subir esse monte e quando chegamos ao ponto mais alto desta parte do percurso, parámos para que pudesse voltar a acrescentar ar à roda traseira, pois o pneu deformava-se tanto que tinha receio de arrancar a válvula.
Restabelecida a pressão, seguimos e iniciámos uma descida não tão abrupta como a subida que havíamos feito, mas também algo forte, novamente em direcção ao Rio Tua.
Seguimos mais uns 6 kms ao longo da margem do rio, sempre com paisagens fantásticas de floresta e vinhas e fomos dar à praia fluvial de Sobreira, cuja fotografia penso que transmite o que lá se sente.
Deixado o Vale do Tua, subimos a Carlão e já só pensávamos em chegar a casa, pois só faltavam cerca de 30 kms para terminarmos mais uma muito agradável “saída”.
Depois de Carlão, ainda tivemos uma subida bem complicada, num trilho todo escavacado pela água, mas chegados ao topo desse monte, foi só descer em trilho de BTT até ao ponto de chegada, onde ainda tivemos oportunidade de beber uma “mini” e despedirmo-nos de 3 dias de boa companhia.
O meu sincero agradecimento aos meus colegas José Pedro e Nando. Foi um “gosto” rolar convosco, porque como dizia uma amiga, “prazer é outra coisa”, e reconheço que só foi possível passar alguns dos locais por onde rolei desta vez, porque contei com a vossa ajuda. Só o saber que estavam lá, já tornava tudo muito mais fácil.
“José Ramos sempre a guiar e a orientar (às vezes nem tanto), com muito bom ritmo.”“Nando sempre com uma disposição contagiante que torna o passar das horas muito mais rápido e agradável e sempre aquela máquina a desenrascar.” O Percurso? Sempre a subir de nível. O primeiro dia: para mim foi sem dúvida o pior em termos de percurso, pois eram trilhos muito estreitos e esburacados, com muita pedra e com paisagens algo limitadas pela orografia muito vincada. Foi o dia que me deu menos gozo fazer.
O segundo dia: muito bom, desde que entrámos junto à fronteira de Sendim (Montalegre), a passagem da Serra do Larouco também ainda foi algo massacrante pela muita pedra, mas depois, toda a travessia do Parque de Montesinho e de parte do Parque do Douro Internacional, com um contraste acentuado de paisagens e tipos de terrenos , foi todo ele muitoooo bom.
O terceiro dia: para mim o melhor, até sairmos do Vale do Tua. É de facto a zona de Portugal onde mais gosto de rolar em fora-de-estrada. A travessia do Parque do Douro Internacional ao longo das arribas do rio, a descida do Vale do Sabor e a descida do Vale do Tua, foram de facto muito agradáveis e sendo assim até se tornou fácil de fazer. Acertámos no sentido do percurso, pois se o tivéssemos efectuado ao contrário, possivelmente iria ser muito penoso fazer a parte menos agradável quando já vínhamos algo cansados dos dois dias anteriores.